Seria Jesus, um zelote?



Reza Aslam, em sua obra, Zelote defende a tese de que Jesus de Nazaré pertencia a este partido judaico que pretendia libertar Israel do domínio romano através de revolta armada. Teria esta tese um fundamento suficiente?
A principal razão que o autor apresenta para se chegar a esta tese seria a condenação recebida por Jesus: crucificação junto com bandidos e a inscrição que afirmava o motivo de sua condenação: "rei dos judeus". Partindo-se daí, poderia-se deduzir que Jesus havia liderado um movimento com a intensão de tornar-se soberano dos israelitas. Além disso Jesus vem da Galileia, um reduto de zelotes (há zelotes entre os apóstolos!).
Para responder a tal afirmativa empreendemos um estudo no Evangelho de Marcos (fonte mais antiga sobre Jesus e que serviu de fonte para os demais evangelhos) referente aos títulos empregados a Jesus.
Nesta proposta, vale a pena atentar-se para os títulos que o evangelista põe na boca dos suplicantes de Jesus, dos seus apóstolos e dele mesmo.
Chamamos aqui suplicantes aqueles que buscavam receber graças de Jesus. Estes são aqueles que, segundo o autor do Evangelho, emitem títulos que virão a constituir a fé cristã: alguns chamam Jesus de Senhor (que não se pode claramente definir como atitude de respeito ou já de veneração), de messias ou de filho de Davi. Os seus apóstolos o chamam majoritariamente de Rabi/Mestre e no caso de Pedro, o reconhece como Cristo (Messias). O cego de Jericó o chama de Filho de Davi. Em Marcos 12,37 Jesus refuta que o verdadeiro Messias seja filho de Davi.
A partir desses títulos entendemos a atividade terrena de Jesus sob dois aspectos: o ensino (que o caracteriza como mestre) e a cura (que o caracteriza como curandeiro, naquela cultura, como profeta ou vidente - nabi).
Quanto ao próprio Jesus, ele se reconhece como Messias, mas não o messias davídico e sim o messias escatológico. O título que Jesus atribui diversas vezes a si mesmo justificaria essa tese. Ele refere-se a si mesmo como "Filho do Homem", e este título remonta à visão de Daniel (7,13): "Eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e o fizeram chegar até ele. E foi-lhe dado o domínio, e a honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem; o seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o seu reino tal, que não será destruído".
O reino do Filho do Homem não é um reino temporal, mas um reino eterno. O que justificaria que Jesus tenha dito que "o seu reino não é deste mundo".
Outro aspecto que pode assegurar a perspectiva de Jesus como um messias sofredor (que se submete ao martírio) e não um messias guerrilheiro, é a visão presente no profeta Isaías do Servo Sofredor. Isto porque na época de Jesus, o livro de Isaías gozava de grande circulação (nas grutas de Qumram - montanhas no deserto da Judéia - foram encontradas várias cópias deste texto utilizadas pelos essênios). Provavelmente era um texto lido nas sinagogas [Lc 4,17-20], e se o programa do ministério de Jesus se assemelha ao programa do servo de Isaías (Is 40-61), isto pode ser mais que uma visão pós-pascal dos discípulos sobre Jesus, mas também uma possibilidade histórica de que Jesus se reconhecesse como o servo descrito por Isaías.
Logo, se se pode afirmar  como uma possibilidade histórica que Jesus tenha sido zelote, é igualmente plausível que sua pretensão messiânica tenha se dado no contexto escatológico. Em outras palavras existiam várias concepções de messias no seu tempo (ainda que a principal seria a de um messias político), porém o livro de Isaías, texto bastante difundido no primeiro século, atesta a versão de um messias que herda a glória, pela obediência e submissão ao sofrimento.
Do ponto de vista cristão, a relação entre o servo sofredor, e o filho do homem glorioso se consolidou na fé sobre as duas vindas: na primeira vinda o Messias veio revestido de simplicidade, mas tendo sido inserido na divindade (à destra do Pai), ele virá uma segunda vez para reinar pela eternidade.


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